Cochrane database of systematic reviews
Peixoto, J & Fleck, JF: Conexão Anticâncer 13(01), 2019
Dados mundiais da International Agency for Research on Cancer (IARC), atualizados para o ano de 2018, mostram o câncer de endométrio ocupando a sexta posição em incidência entre os tumores malignos diagnosticados na mulher (número absoluto = 382069 e ASR= 8.4). Trata-se de um tumor insidioso com apresentação predominante após a menopausa e em 70% das vezes diagnosticado em estádio FIGO I, o que confere 90% de expectativa na sobrevida em cinco anos. Um percentual menor de pacientes (13%) é diagnosticado em estádios avançados (FIGO III e IV) com redução da expectativa de sobrevida em cinco anos, respectivamente para 60% e 30%. Nestes estádios avançados, o tratamento consiste em cirurgia citorredutora seguida de quimioterapia, radioterapia ou ambas. A indefinição quanto a melhor alternativa terapêutica complementar a cirurgia conduziu à presente revisão sistemática.
O objetivo foi avaliar a eficácia e segurança da quimioterapia (QT) em comparação com a radioterapia (RT) ou tratamento combinado (QT + RT) em mulheres com câncer endometrial (CE) avançado (FIGO III e IV), submetidas a cirurgia citorredutora. Sustentados por um baixo a moderado risco de viés, foram encontrados quatro ensaios clínicos multicêntricos prospectivos e aleatórios (ECMA) envolvendo 1269 mulheres com carcinoma de endométrio, estádios III e IV. Dois estudos compararam QT x RT adjuvantes, incluindo 620 pacientes com CE (83% estádio III e 17% estádio IV). Um terceiro ensaio clínico incluiu 552 pacientes com CE (88 % estádio III e 12% estádio IV) e comparou dois programas de QT (um braço CD tratado com o dublet cisplatina + doxorrubicina versus um braço CDP tratado com o triplet cisplatina + doxorrubicina + paclitaxel) em mulheres previamente submetidas a RT adjuvante. O quarto ECMA não contribuiu com dados.
A sobrevida global (SG) e sobrevida livre de progressão (SLP) foram maiores com quimioterapia adjuvante em comparação com radioterapia adjuvante: Respectivamente SG (HR 0,75, IC 95% 0,57 - 0,99, I² = 22%) e SLP (HR 0,74, IC 95% 0,59 - 0,92, I² = 0%). Dados de um estudo mostram que as mulheres que receberam quimioterapia adjuvante apresentam maior probabilidade de sofrer eventos adversos hematológicos, neurológicos e alopecia, e mais propensas a descontinuar o tratamento do que aquelas que receberam radioterapia adjuvante. Não houve diferença estatística nas mortes relacionadas ao tratamento entre os braços de adjuvância com quimioterapia ou radioterapia. No ensaio clínico que comparou a quimioterapia adjuvante composta por CD versus CDP não houve diferença estatística quanto a SLP. Eventos adversos hematológicos e neurológicos graves ocorreram com maior frequência com CDP do que com CD.
Dessa forma, existem evidências de qualidade moderada indicando um ganho de 25% no tempo de sobrevida das pacientes com CE estádios III e IV submetidas a cirurgia citorredutora + QT adjuvante versus cirurgia citorredutora + RT adjuvante. Este conceito foi corroborado pelo estudo PORTEC-3, já discutido anteriormente neste site. Adicionalmente, dados preliminares do estudo GOG 258, com seguimento mediano de 47 meses, não vem demonstrando diferença na sobrevida livre de recidiva ou recorrência a distância para pacientes com CE tratadas com uso exclusivo de QT adjuvante em comparação à combinação QT + RT.
Embora a revisão sistemática e a metanálise representem os melhores níveis de evidência clínica, a qualidade é dependente dos estudos que as integram. Para o tratamento adjuvante do CE avançado (III e IV) pós-cirurgia citorredutora há uma tendência de benefício com QT adjuvante, porém a heterogeneidade e o pequeno número de estudos não permitem uma conclusão definitiva.
ASR = Age Standardized Rate
Referência:
Galaal K, Al Moundhri M, Bryant A, Lopes AD, Lawrie TA.: Adjuvant chemotherapy for advanced endometrial cancer, Cochrane Database of Systematic Reviews 2014, Issue 5. Art. CD010681
O carcinoma de endométrio é o câncer ginecológico mais comum do mundo desenvolvido. A maioria das mulheres apresenta-se no estádio I da doença, com bom prognóstico e taxa de sobrevida global superior a 90%. No Brasil, esses dados nem sempre remetem à realidade, uma vez que nem todas as mulheres, principalmente as de baixo nível socioeconômico tem acesso à saúde ginecológica de forma continuada ao longo da vida, sendo diagnosticadas em estágios mais avançados. A maioria das pacientes se encontra na pós-menopausa, com apenas 25% de pré-menopausadas e 3% de pacientes abaixo dos 40 anos de idade. De acordo com as diretrizes internacionais, o tratamento curativo para o carcinoma endometrial é cirúrgico (histerectomia total abdominal e salpingo-ooforectomia bilateral seguida ou não de linfadenectomia pélvica e para-aórtica), seguido de quimioterapia(QT), radioterapia(RT) ou o tratamento combinado (QT +RT). O presente estudo traz a avaliação da eficácia e segurança da QT em comparação com a RT ou tratamento combinado ( em mulheres com câncer endometrial avançado (FIGO III e IV), tendo como resultado que pode haver ganho de 25% de sobrevida da QT em relação a RT, mas não dados conclusivos quanto ao tratamento combinado. Importante lembrar também que, o uso de qual tratamento adjuvante segue-se após a cirurgia, depende de uma série de questões, que devem ser levadas em consideração quando o médico e a paciente forem tomar essa decisão, como fatores de risco da paciente, comorbidades, estágio da doença, se há metástase, se o tratamento aumentaria a sobrevida mas mantendo a qualidade de vida, quais os desejos da paciente, por exemplo. Dessa forma, nota-se a importância de que haja mais investimento em pesquisas nessa área que embasem de forma concisa a escolha do tratamento para cada estágio da doença.
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