Uso racional de novas drogas no tratamento do melanoma metastático

Decifrando o caldo biológico

Fleck, JF & Souza, F: Conexão Anticâncer 09(04), 2018

O comportamento biológico das células tumorais em seu espectro de proliferação  aberrante, perda da apoptose, disseminação metastática e estímulo da angiogênese é mediado por cadeias de transdução de sinal que em visão simplista compõem a MAPK (Mitogen-Activated Protein Kinase). Diversas neoplasias malignas mantem a MAPK constantemente ativa, através da ligação de fatores de crescimento a receptores da tirosina quinase (TK), bem como mutação RAS e RAF. Vários efetores de sinalização de transdução conduzem à ativação RAF, o que, sequencialmente, promove a fosforilação MEK e ERK, responsáveis pela ação sobre substratos nucleares e citoplasmáticos promotores do fenótipo celular maligno. Das três isoformas de RAF (A-Raf, B-Raf e C-Raf), BRAF é a mais ativa e sua mutação está particularmente presente no melanoma.

Cerca de 50% dos melanomas apresentam mutação BRAF, predominando uma alteração no códon 600, caracterizada como BRAFV600E.  Nesta circunstância, a ativação BRAF ganha autonomia, não respondendo mais a fatores reguladores e promovendo uma multiplicação celular excessiva, o que resulta na progressão do melanoma. O dabrafenib é uma droga que bloqueia e expressão de BRAF mutado, interrompendo a cascata de transdução de sinal para multiplicação celular neste grupo de pacientes com melanoma metastático. Todavia em cerca de 6 meses emerge resistência celular com reativação MAPK. Adicionalmente, existe uma ativação paradoxal de MAPK, promovendo oncogênese secundária, particularmente de carcinoma epidermóide na pele. O trametinib é um inibidor MEK, que conduz a um bloqueio proliferativo complementar e que não está associado a ativação paradoxal de MAPK. O benefício clínico da combinação dabrafenib + trametinib no tratamento do melanoma metastático BRAF mutado foi publicado no New England Journal of Medicine em 2014, refletido em desfechos substitutivos (índice de respostas objetivas e sobrevida livre de progressão). Como esperado, ocorreu com o duplo bloqueio uma redução no índice de oncogênese secundária, valorizando a eficácia da combinação. O rigor estatístico aplicado à análise interina, não permitiu, ainda, nesta publicação valorizar os 37% de redução relativa do risco de morte observado com o uso da combinação. No momento da publicação já era possível identificar uma magnificação do benefício em pacientes com pior prognóstico. No grupo com LDH elevada, em que os eventos ocorrem mais precocemente, a combinação produziu uma impressionante redução relativa do risco de morte de 52%, quando comparada ao uso exclusivo de dabrafenib.

Outro cenário é o do melanoma metastático BRAF não-mutado (BRAF wild-type) em que a opção terapêutica atual recai sobre os inibidores de checkpoints imunológicos anti-CTLA4 (ipilimumab) e anti-PD1 (pembrolizumab e nivolumab) que restauram o reconhecimento imunológico sobre as células tumorais. O melhor índice em custo-efetividade em melanoma avançado BRAF wild-type foi observado com dois esquemas sequenciais: Esquema I (pembrolizumab a cada três semanas em primeira linha, seguido de ipilimumab em segunda linha) e Esquema II (nivolumab em primeira linha, seguido de ipilimumab em segunda-linha).

 

Referências:

Long, GV; Stroyakovskiy, D; Gogas, H; et al: Combined BRAF and MEK Inhibition versus BRAF Inhibition Alone in Melanoma, Ne Engl J Med 371: 1877 – 1888, 2014

Kohn CG; Zeichner SB; Chen Q: Cost-Effectiveness of Immune Checkpoint Inhibition in BRAF wild-type Advanced Melanoma, J Clin Oncol 35: 1194 – 1202, 2017