Tratamento do carcinoma da junção esofagogástrica (JEG)

Estudos multinacionais heterogêneos frente a um tumor de incidência crescente

Fleck, JF & Peixoto, JL: Conexão Anticâncer 03(04), 2017

A virada do século vem testemunhando uma incidência crescente no adenocarcinoma do esôfago distal e junção esofagogástrica (JEG). A cirurgia Ro sempre representou um fator preditivo de melhora prognóstica, especialmente quando associada a interferências pré-operatórias que conduziam a remissão histopatológica completa (RCp). A combinação de quimioterapia com ou sem radioterapia ao tratamento cirúrgico vem sendo objetivo de diversos estudos internacionais aleatórios de fase III. Embora sejam heterogêneos nos critérios de elegibilidade e interferência terapêutica, todos visam aumentar o índice de ressecções Ro e RCp, que associados a um melhor controle sistêmico da doença conduzem a uma maior sobrevida livre de progressão e eventualmente sobrevida global.

Os grandes estudos internacionais multicêntricos prospectivos e aleatórios estão focados quase que em sua totalidade no adenocarcinoma (ver tabela abaixo). Uma exceção é o CROSS TRIAL que adicionalmente admite em seu critério de elegibilidade o carcinoma de esôfago espinocelular (CEC). Visando agilizar o accrual e aumentar o n, há uma tentativa de uniformização do comportamento biológico dos adenocarcinomas situados no trato gastrintestinal superior (esôfago distal, JEG e estômago). Estas são doenças distintas que convivem apenas com a proximidade anatômica e compartilham de uma histogênese glandular. A heterogeneidade contamina as orientações terapêuticas, criando estudos com perguntas distintas, o que fragiliza o consenso. Estudos europeus   tendem a avaliar interferências pré ou perioperatórias com quimioterapia exclusiva (MAGIC, FFCD) ou combinações de quimioterapia + radioterapia (POET, CROSS). Nos Estados Unidos, o foco é o tratamento pós-operatório (adjuvante) com quimioterapia + radioterapia (INT 116). Paralelamente, um grande número de estudos internacionais foram reunidos em uma metanálise conduzida pela COCHRANE para constatar o benefício da quimioterapia adjuvante especificamente no carcinoma gástrico. A complexidade fica magnificada ao considerar a extensão dos procedimentos cirúrgicos, predominando ressecções ampliadas (D2) no oriente versus ressecções mais conservadoras (D1) no mundo ocidental. Também não existe consenso quanto ao melhor programa de quimioterapia perioperatória. Dados preliminares tem favorecido a inclusão de combinações com oxaliplatina (FOLFOX), acrescidas de docetaxel (FLOT) no tratamento perioperatório do adenocarcinoma da JEG. Não é infrequente a existência de correstes conflitantes. Em um recente editorial publicado no Journal of Clinical Oncology e assinado pelo MD Anderson Cancer Center, Sloan Kettering Memorial Hospital, entre outras importantes instituições americanas, foi fortemente recomendada a exclusão da epirubicina (MAGIC TRIAL) do programa de tratamento combinado do adenocarcinoma da JEG.

Em um cenário universal de decisões terapêuticas plurais para o adenocarcinoma da JEG, sobrevivem alguns conceitos básicos: Não parece existir espaço para tratamentos exclusivos com cirurgia, RT ou QT, os tratamentos combinados incluindo quimioterapia e QRT em diferentes cenários cirúrgicos (perioperatório ou adjuvante) conduzem a melhora em sobrevida livre de progressão e sobrevida mediana e a maturação dos dados passa pelo desenvolvimento de estudos específicos incluindo apenas pacientes com adenocarcinoma da JEG.


TP=Tumor Primário, JEG=Junção Esofagogástrica, ADENO=Adenocarcinoma, CEC=Carcinoma Espinocelular, QT=Quimioterapia, QRT=Quimioterapia + Radioterapia,SLP=Sobrevida Livre de Progressão,RPC=Remissão Patológica Completa, Ro=Ressecção Completa, SV=Sobrevida, SG=Sobrevida Global