Nova Era no Tratamento do Câncer

Assinatura molecular quebra paradigma

James Fleck: Conexão Anticâncer 29 (06), 2020

Felizmente, estamos no início de uma nova era na avaliação e tratamento do câncer. A biologia molecular tem sido responsável por importante melhoria no reconhecimento das características microambientais do tumor, que vão muito além da morfologia celular e tecidual. Nas células neoplásicas, os estudos de sequenciamento do DNA sugerem a instabilidade genética como um fundamento para a oncogênese, não apenas em neoplasias hereditárias, mas também em um grande grupo de tumores com expressão esporádica. Alta instabilidade de microssatélites (High Microsatellite Instability = MSI-H) associada a deficiência de reparo do DNA (Mismatch Repair-Deficiency = MMR-d) e alta carga mutacional do tumor (High Tumor Mutational Burden = TMB-H) são marcadores preditivos para imunoterapia em uma ampla variedade de tumores não-histologicamente relacionados. A assinatura genética de tumores com MMR-d abriga 10 a 100 vezes mais mutações do que tumores com proficiência no reparo do DNA (MMR-p), promovendo mutações em sequências repetitivas de DNA, caracterizada como alta instabilidade de microssatélites (MSI-H). A MMR-d é observada em vários tumores primários independente de histologia, como câncer de endométrio, câncer gástrico e câncer colorretal, entre outros. Mutações, produzidas principalmente por deleções ou inserções na estrutura do DNA tumoral, resultam em antígenos mutantes. Quando os antígenos mutantes são apresentados pelo complexo de histocompatibilidade maior, o tumor passa a ser melhor reconhecido pelo sistema imunológico do hospedeiro e defende-se dele utilizando proteínas e ligantes de checagem imunológica. Além da alta expressão nas células tumorais MMR-d / MSI-H do ligante para morte celular programada-1 (PD-L1), um número maior de linfócitos de infiltração tumoral (Tumor Infiltrating Lymphocytes = TIL) apresenta supra desnivelamento na expressão de proteínas de morte celular programada-1 (PD-1). A despeito de ser uma tentativa de proteção tumoral contra o sistema imunológico, ambas as expressões fenotípicas microambientais tornam esses tumores particularmente suscetíveis ao tratamento com bloqueadores de ponto de checagem imunológica PD1 / PD-L1.

Em outubro de 2019, o Journal of Clinical Oncology publica os resultados do estudo de fase II Keynote-158 demonstrando uma taxa de resposta RECIST de 34,3% com o uso de pembrolizumab (anti-PD-1) em pacientes com 27 tipos diferentes de tumores MMR-d / MSI-H irressecáveis ou metastáticos e previamente tratados. Aproximadamente, um terço dos pacientes com resposta objetiva apresentou resposta completa. A sobrevida global mediana foi de 23,5 meses. A análise de Kaplan-Meier mostrou que mais de três quartos dos respondedores tiveram respostas duráveis, o que levou a uma taxa de sobrevida global estimada em 48 meses de 48,9%. Eventos imunológicos adversos e reações infusionais foram relatados em 23,2% dos pacientes, mas a maioria com grau 1 e 2. Os resultados observados neste estudo apoiaram a aprovação do pembrolizumab intravenoso 200 mg a cada 3 semanas para o tratamento de câncer avançado MSI-H / dMMR, independentemente da localização da lesão primária, bem como de sua histologia. Adicionalmente, a carga mutacional do tumor (TMB) também tem sido utilizada como marcador prognóstico e preditivo. No entanto, algumas desvantagens ainda limitam a adoção do TMB para a tomada de decisão clínica. O painel de sequenciamento pode superestimar o TMB devido a vieses no design do painel, além de não haver uma definição clara do que deve ser chamado de elevada TMB (TMB-H), normalmente variando de 10 a 20 mutações / megabase. Atualmente, a inconsistência foi superada usando o sequenciamento completo do exoma (Whole-Exome Sequencing = WES) ou melhorando a robustez do TMB por meio de um novo modelo estatístico com uma estrutura bayesiana preditiva, chamada ecTMB (estimation and classification of TMB). Independentemente do método usado para avaliar a carga mutacional do tumor, o fenótipo microambiental estará em breve orientando o tratamento personalizado, melhorando a relação custo-efetividade e consolidando uma nova realidade no tratamento do câncer.

RECIST = Response Evaluation Criteria in Solid Tumors


Referências:

1.     Aurelien Marabelle, Dung T. Le, Paolo A. Ascierto, et al: Efficacy of Pembrolizumab in Patients with Non-colorectal High Microsatellite Instability/ Mismatch Repair–Deficient Cancer: Results from the Phase II KEYNOTE-158 Study, J Clin Oncol 38:1-10, 2019

2.     Lijing Yao, Yao Fu, Marghoob Mohiyuddin & Hugo Y. K. Lam: ecTMB: a robust method to estimate and classify tumor mutational burden, Nature, 10:4983, 2020

3.     Photo by National Cancer Institute on Unsplash