Avaliação crítica de fatores preditivos
Fleck, JF: Conexão Anticâncer 06(08), 2019
Em abril de 2019 a revista Lancet publica os resultados do estudo internacional Keynote-042 ampliando o uso exclusivo de imunoterapia com pembrolizumab (anticorpo monoclonal humanizado IgG4 anti-PD1) no espectro dos tratamentos customizados para carcinomas de pulmão não de pequenas células metastáticos ou avançados. O critério de elegibilidade incluiu pacientes com proporção de escore tumoral (Tumor Proportion Score - TPS) PD-L1 ≥ 1% (utilizando o teste padrão IHC 22 C3 PharmDx) destituídos de mutação-EGFR ou translocação ALK. Um total de 1274 pacientes foram distribuídos aleatoriamente na proporção de 1:1 para imunoterapia exclusiva (pembrolizumab 200 mg) versus quimioterapia exclusiva (carboplatina AUC 5-6 combinada com paclitaxel 200 mg/m2 ou pemetrexede 500 mg/m2, conforme subtipo histológico). Os pacientes tinham uma idade mediana de 63 anos, predominando sexo masculino (70%), tabagistas (78%), com histologia não-escamosa (63%), doença metastática (88%) e elevado TPS (PD-L1 ≥ 50%) em 47% dos casos. Não foi permitido crossover na progressão. Após um seguimento mediano de 12.8 meses a sobrevida global favoreceu o uso exclusivo de pembrolizumab em todos os subgrupos de TPS e apresentou menor toxicidade (grau ≥ 3) na comparação com quimioterapia exclusiva. Todavia, a análise exploratória do subgrupo TPS intermediário (PD-L1 1% - 49%) não ratificou o benefício com o uso exclusivo de pembrolizumab, o que remete a hipótese de que os resultados nos três subgrupos com expressão crescente de PD-L1 deveram-se a contaminação com um alto percentual (47%) de pacientes expressando TPS elevado (PD-L1 ≥ 50%). Este também foi o único subgrupo no qual a sobrevida livre de progressão (SLP) favoreceu o uso exclusivo de pembrolizumab. Nos subgrupos com expressão TPS mais ampla (PD-L1 ≥ 20% e PD-L1 ≥ 1%) a SLP favoreceu o uso da quimioterapia exclusiva. O estudo é adicionalmente fragilizado por extrapolar a expressão populacional esperada de 30% para o subgrupo TPS elevado (PD-L1 ≥ 50%) e também por não admitir o indispensável crossover em um momento histórico caracterizado por múltiplos estudos que remetem para uma crescente cronificação do carcinoma de pulmão não de pequenas células avançado. Felizmente, o estudo Keynote-024, desenhado para pacientes com TPS elevado (PD-L1 ≥ 50%) admitiu o crossover. Um recente update do Keynote-024, publicado no Journal of Clinical Oncology em março de 2019 confirmou o benefício obtido com o uso exclusivo de pembrolizumab após análise de crossover.
Os resultados promissores observados na imunoterapia do carcinoma não de pequenas células avançado EGFR-wild e destituídos da translocação ALK são dependentes de fatores preditivos. A expressão de TPS elevado (PD-L1 ≥ 50%) encontra sustentação em estudos prospectivos e aleatórios com adequado poder estatístico. Paralelamente, identifica-se no estudo CheckMate 227, a alta carga mutacional tumoral (TMB ≥ 10 mutações/ megabase) como um novo fator preditivo de resposta ao tratamento combinado de nivolumab (anticorpo monoclonal humanizado IgG4 anti-PD1) + ipilimumab (anticorpo monoclonal humanizado IgG1 anti-CTLA-4). O benefício parece ocorrer independente do percentual de expressão PD-L1, porém os resultados são ainda imaturos.
TMB = Tumor mutational Burden
Referências:
Tony S K Mok, Yi-Long Wu, Iveta Kudaba, et al: Pembrolizumab versus chemotherapy for previously untreated, PD-L1-expressing, locally advanced or metastatic non-small-cell lung cancer (KEYNOTE-042): a randomised, open-label, controlled, phase 3 trial, Lancet 393: 1819–30, 2019
Reck M, Rodriguez-Abreu D, Robinson AG, et al: Updated Analysis of KEYNOTE-024: Pembrolizumab Versus Platinum-Based Chemotherapy for Advanced Non-Small-Cell Lung Cancer With PD-L1 Tumor Proportion Score of 50% or Greater, J Clin Oncol 37(7):537-546, 2019
Hellmann MD, Ciuleanu TE, Pluzanski, A, et al: Nivolumab plus Ipilimumab in Lung Cancer with High Tumor Mutational Burden, N Engl J Med 378: 2093, 2018
O artigo em questão mostra que a imunoterapia é uma alternativa terapêutica para carcinoma de pulmão de não pequenas células metastáticos ou avançados, mostrando uma sobrevida global em meses maior em todos os grupos de pacientes estratificados pela proporção de escore tumoral tratados com imunoterapia exclusiva em comparação com os pacientes tratados com quimioterapia exclusiva. Esses resultados são promissores, mas são dependentes de fatores preditos.
A imunoterapia já desponta como realidade terapêutica no campo da oncologia. No caso de carcinomas de pulmão de células não pequenas, sobretudo naqueles pacientes com tumores que expressam PD-L1 em ao menos 50% das células, o tratamento com o anticorpo monoclonal Pembrolizumab apresentou maiores sobrevida livre de progressão e sobrevida global em relação à quimioterapia (Keynote-024). O benefício, a princípio, parece se estender para populações de diferentes valores de expressão PD-L1 (Keynote-042), mas os resultados ainda são muito incipientes e dependentes de valores preditivos – além da possibilidade de contaminação de subgrupos, como já citado no artigo. Com perfil de segurança melhor que a quimioterapia, é uma imunoterapia promissora e que merece maior atenção para futuros estudos.
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