Combinação de quimioterapia + radioterapia no carcinoma de nasofaringe localmente avançado

Visão histórica de um tumor raro com recomendação terapêutica congelada há vinte anos

Cardoso, PN & Fleck, JF: Conexão Anticâncer 12(06), 2018

O carcinoma de nasofaringe (CNas) é um tumor raro na América e Europa Ocidental. A International Agency for Research on Cancer (IARC) aponta para aproximadamente 86000 casos novos diagnosticados no mundo, anualmente, predominando no sudeste asiático. Costuma ser diagnosticado em fase localmente avançada (estádios III e IV) caracterizado por invasão locorregional pelo tumor primário, associada a metastatização cervical. A Organização Mundial da Saúde (OMS) admite três formas de expressão morfológica: Carcinoma de células escamosas queratinizado (tipo I), carcinoma não-queratinizado (tipo II) e carcinoma indiferenciado (tipo III). Um melhor prognóstico está associado com os tipos II e III, o sexo feminino, pacientes jovens e maior infiltrado tumoral linfocitário. A despeito da raridade nos EUA, a alta sensibilidade do CNas à radioterapia (RT) e à quimioterapia (QT) observada em estudos de fase II na década de 90, conduziu o Southwest Oncology Group (SWOG) a propor uma associação com o Radiation Therapy Oncology Group (RTOG) e o Eastern Cooperative Oncology Group (ECOG) desenhando um estudo aleatório de fase III denominado Intergroup Trial 0099. Os resultados foram apresentados na Filadélfia em 1996 por ocasião do 32nd Annual Meeting of the American Society of Clinical Oncology e festejado como um bem-sucedido modelo de efeito sinérgico obtido com a concomitância no uso de RT + QT.

Em abril de 1998 o Journal of Clinical Oncology publicou na íntegra os resultados do Intergroup Trail 0099. No braço de tratamento combinado cisplatina na dose de 100 mg/m2 foi administrada em concomitância com a RT nos dias D1, D22 e D43 visando efeito sensibilizante seguida de três ciclos adicionais de QT composta por cisplatina 80 mg/m2 + 5FU infusional 1000 mg/m2 / D1 – D4 / 4 semanas. A mediana da sobrevida livre de progressão foi de 15 meses no braço com RT isolada e não foi atingida no braço de tratamento combinado. A taxa de sobrevida em 3 anos foi de 47% no braço RT e 78% no braço RT +QT (P=0,005). Os eventos adversos graves (grau 3 ou 4) foram mais comuns no grupo de tratamento combinado. Mesmo sustentado por uma distribuição aleatória, observou-se um maior percentual de homens e de CNas queratinizado (tipo I) no braço de RT isolada, ambos associados a piora prognóstica com implicações não-avaliáveis. Dados maduros nunca foram publicados. No entanto, a despeito das eventuais falhas metodológicas e/ou follow-up este é um estudo caracterizado como marco histórico que continua há vinte anos sustentando a melhor recomendação terapêutica para o CNas localmente avançado.


Referência:

Muhyi Al-Sarraf, Michael LeBlanc, P.G. Shanker Giri, et al: Chemoradiotherapy Versus Radiotherapy in Patients with Advanced Nasopharyngeal Cancer: Phase III Randomized Intergroup Study 0099, J Clin Oncol 16: 1310-17, 1998