Desvendando o lado belo da fera
Fleck, JF: Conexão Anticâncer 29(05), 2018
O tratamento com quimioterapia antiblástica sistêmica sempre foi sustentado por seu efeito citotóxico, limitado a baixa especificidade. O aumento da sobrevida do adenocarcinoma brônquico EGFR e ALK não-mutado (AbnM) com a combinação pemetrexed + derivados de platina ocorre às custas de considerável toxicidade, restringindo a intervenção aos pacientes com boa performance. As limitações no índice terapêutico refletem o lado perverso da quimioterapia (QT), relacionado ao dano indiscriminado à molécula de DNA. Recentemente, a imunoterapia com pembrolizumab (Pmab) já substituiu a QT no tratamento de primeira-linha de pacientes com AbnM que apresentam expressão de PD-L1 ≥ 50%. Todavia, tem sido possível identificar uma potencial interferência da QT com os sistemas de vigilância imunológica adquiridos, configurando o lado belo da fera. A QT após a destruição de células tumorais, aumenta a apresentação de antígenos para reconhecimento imunológico pelas células dendríticas, inibe a expressão de STAT6 (signal transducer and activator of transcription 6) o que irá promover downregulation de PD-L2, tornando as células neoplásicas mais visíveis ao sistema imunológico. Este racional sustenta a hipótese alternativa para o uso combinado de QT + inibidores de check points imunológicos (anti-PD1 e anti-PD-L1) no tratamento de primeira linha do AbnM – doença metastática.
Em abril de 2018, o New England Journal of Medicine publica o estudo KEYNOTE-189. Trata-se de um estudo prospectivo duplo-cego de fase III no qual 616 pacientes com AbnM - doença metastática são distribuídos aleatoriamente na proporção de 2:1 para tratamento em primeira linha com QT (pemetrexed + derivado de platina) combinado com Pmab ou placebo. Resultados preliminares mostram benefício favorável à associação de QT + Pmab, revelando 69,2% sobrevida global aos 12 meses versus os 49,4% obtidos com QT exclusiva (P<0.001). O benefício atingiu todos os subgrupos de expressão de PD-L1. A sobrevida livre de progressão mediana foi de 8,8 meses no grupo com QT + Pmab versus 4,9 meses no braço com QT exclusiva (P< 0.001). Como esperado, houve maior número de efeitos adversos imuno-mediados no braço de tratamento QT + Pmab, destacando-se pela gravidade pneumonite e nefrite. Embora o racional e os resultados sejam atraentes, trata-se de análise interina, cuja maturação dos dados irá definir se existe um lado belo na quimioterapia quando associada a imunoterapia no tratamento de primeira linha do AbnM – doença metastática.
Referência:
Leena Gandhi, Delvys Rodríguez-Abreu, Shirish Gadgeel, et al: Pembrolizumab plus Chemotherapy in Metastatic Non–Small Cell Lung Cancer, N Engl J Med April 16th, 2018
Nos últimos anos o conhecimento molecular vem evoluindo e muito e com isso o cenário de diversos tumores foi modificado, com beneficios para os pacientes. O estudo KEYNOTE-189 avaliou o tratamento do adenocarcinoma brônquico EGFR e ALK não-mutado com combinação que quimioterapia + imunoterapia em comparação com placebo.Os grupos foram randomizados para receberem primeira linha com QT (pemetrexed + derivado de platina) combinado com Pmab ou placebo. Trata-se de um estudo com resultados estaticamente significativos ( P<0,001) e mostrou um benefício favorável à associação de QT + Pmab, revelando 69,2% sobrevida global aos 12 meses versus os 49,4% obtidos com QT exclusiva e o tempo de sobrevida foi de 8,8 meses no grupo com QT + Pmab versus 4,9 meses no braço com QT exclusiva. Esses resultados, mesmo com os efeitos adversos do Pmab, dá uma perspectiva positiva em relação ao tempo de sobrevida dos pacientes, um aspecto com impacto enorme na hora de definir um tratamento e tomar decisões junto ao paciente.
O cenário do tratamento de diversos tumores têm evoluído desde a introdução da biologia molecular e imunoterapia. O estudo KEYNOTE-189 nos traz importante impacto no tratamento de adenocarcinoma brônquico EGFR e ALK não-mutado - doença metastática com associação Pembrolizumab (Pmab) + QT (pemetrexed + derivado de platina) mostrando 69,2% de sobrevida global aos 12 meses versus os 49,4% obtidos com QT exclusiva (P<0.001) e sobrevida livre de progressão mediana foi de 8,8 meses no grupo com QT + Pmab versus 4,9 meses no braço com QT exclusiva (P< 0.001). Esse estudo mostra aumento de efeitos adversos, como pneumonite e nefrite, o que faz pensar em diminuição da qualidade de vida dos pacientes associado aumento de sobrevida limitado de 4 meses, deve-se levar em conta tais efeitos. Entretanto, o estudo restringe-se a pacientes com doença mais avançada e grave o que pode limitar o efeito do tratamento.
O uso de imunoterapia em vários tipos de câncer tem sido extensamente estudado. Um exemplo de tumor que já mostrou responder muito bem a esse tipo de tratamento, é o adenocarcinoma brônquico com mutações EGFR e ALK, sendo essas mutações, alvos para drogas que aumentaram a sobrevida destes pacientes, que antes eram tratados com quimioterapia apenas, o que levava a um grande número de efeitos adversos devido a quimiotoxicidade. Esse estudo, sem dúvidas, nos mostra que os pacientes sem mutação que antes se achava que não teriam benefício com a imunoterapia, apresentaram resultados bastante promissores. Os resultados preliminares mostram que o grupo QT + Pmab, teve 69,2% sobrevida global aos 12 meses versus os 49,4% obtidos com o grupo que utilizou QT exclusiva. A sobrevida livre de progressão mediana foi de 8,8 meses no grupo com QT + Pmab versus 4,9 meses no braço com QT exclusiva. No entanto, deve-se levar em conta que o tratamento com imunoterapia leva ao aparecimento de um maior número de efeitos adversos imunomediados (como nefritre, pneumonite, etc), por isso, os benefícios e os riscos devem ser levados em conta na situação de cada paciente. Por mais que os resultados tenham sido excelentes, devemos lembrar que esta foi apenas uma análise interina e análises posteriores se fazem necessárias.
Embora estudos adicionais tenham sido apresentados além desses dados, esse estudo tem muito a considerar em termos de como ele deve mudar nossas práticas clínicas para pacientes com CPNPC avançado de tipo EGFR e ALK..Minha opinião é que o estudo KEYNOTE-189 deve ter um impacto maior, levando-nos a ser muito mais inclinados a favorecer a combinação de carboplatina / pemetrexed / pembrolizumab já aprovada pela FDA para pacientes elegíveis, pelo menos aqueles com expressão de tumor PD-L1 menor que 50%.Mas é importante destacar o grande impacto, nesses últimos anos, em questão dessas novas linhas de tratamento, em como estão mudando a sobrevida de pacientes, e isso é muito gratificante.
Muito interessante e importante o artigo em questão por se tratar de uma terapia mais efetiva em alongar a sobrevida dos pacientes nesse tipo de câncer. No entanto vale ressaltar alguns pontos não mencionados, como: custo muito elevado das medicações (possivelmente tornando o SUS como maior financiador da terapia); efeitos colaterais que podem ser severos; apenas alguns pacientes poderiam usufruir de tal terapêutica (por isso pode-se fazer necessário utilizar combinações de medicamentos ou outras opções de tratamento para melhorar seus efeitos e determinar qual formulação é melhor para cada paciente).
Claro que ainda faltam estudos, inclusive avaliando por mais longo prazo, mas é cativante ver como a identificação do PD-L1 foi significativa e já possibilitou que surgisse a "bela" pembrolizumab, servindo de acompanhante para a QT, a "fera". Acredito que ainda não é possível tornar esse tratamento primeira linha para indivíduos EGFR e ALK não-mutados, devido ao défcit de estudos, mas penso que a imunoterapia e a identificação de genes seja, realmente, o futuro da oncologia!
As últimas duas décadas de avanço da biologia molecular juntamente à medicina possibilitaram que a clínica dispusesse de ferramentas outrora incacreditáveis. A análise molecular de neoplasias começou a permitir que compreendêssemos genótipos mutados a ponto de sermos capazes de construir Imunoglobulinas esculpidas perfeitamente para interação com proteínas de membrana e transdutores de sinal responsáveis pela subsistência tumoral, uma terapêutica de inteligência e elegância ímpar. Contudo, perfis genéticos que não revelam mutações específicas contra as quais é possível agir são extremamente frustrantes, principalmente quando falamos em sítios tumorais de prognóstico geralmente reservado, como o pulmão. Deparado-nos com esses casos, como os adenocarcinomas brônquicos EGFR e ALK não-mutado, podíamos apenas recorrer à grosseira tríade terapêutica que envolve cortar (cirurgia), intoxicar (quimioterapia) e queimar (radioterapia). Até o surgimento da Imunoterapia. Também possível graças ao avanço da biologia molecular, afinal a inibição de um checkpoint imunológico também é uma terapia alvo, ela veio possibilitar não só um tratamento mais refinado e aumento da sobrevida em neoplasias de mutações negativas para várias terapias alvo, como também explorar o lado "belo" da intoxicação quimioterápica que é a realidade da Oncologia há tantos anos. Contudo, por mais que tenha aumentado o espectro de genótipos contra os quais drogas podem atuar (agora carcinomas broncogênicos não pequenas células devem não expressar níveis de PDL-1, além de não serem mutados para EGFR e ALK), ainda existem tumores que desafiam tanto terapias alvo quando drogas imunoterápicas. Além disso, os paraefeitos de imunoterápicos, somados à quimioterapia, podem ser nefastos. Dessa maneira, a procura por novos receptores de membrana e vias de transdução de sinal envolvidas no silenciamento da ação imune deve ser contínua, para que nenhum genótipo possa se esvair e para que a Imunoterapia continua trazendo consigo mais beleza à fera, possibilitando ciclos quimioterápiocs mais curtos, eficientes e menos citotóxicos para os pacientes.
Pacientes com esse subtipo histológico sem mutações EGFR e ALK tiveram redução de 50% nos desfechos com a adição de pembrolizumabe a pemetrexed e um derivado de platina, com uma taxa de resposta maior quando comparado ao grupo placebo, e com único efeito adverso significativo sendo uma baixa incidência de disfunção renal. A modulação da resposta imune através da inibição de PD-1 pode ser aumentada pelos potenciais imunogênicos da quimioterapia (lado “bela”), como através do aumento do potencial da apresentação cruzada de antígenos pelas células dendríticas depois da destruição das células tumorais, do aumento dos linfócitos citotóxicos para células Treg, e do bloqueio da via STAT6 para aumentar a atividade das células dendríticas. Resta uma dúvida: a adição de pembrolizumab a permetrexed e um derivado de platina tem maior eficácia do que a MONOTERAPIA com pembrolizumab nesses pacientes? Em relação à terapia alvo-específica (por genótipo), não creio que "cercar" todas as mutações existentes e potencialmente existentes seja plausível em termos de saúde pública, nem mesmo em termos de investimentos financeiros em novas drogas. Creio que o futuro com a imunoterapia (na teoria) seja muito mais inteligente, pois a imunoterapia não é tão específica e, caso outras mutações surjam, as drogas existentes ainda poderiam "dar conta" do tratamento, ainda mais contando com a memória imunológica.
Falar de imunoterapia parece sempre promissor, uma vez que os resultados dos biológicos sustentam essa empolgação. Dessa forma, o estudo KEYNOTE-189 vem corroborar com essa visão. Chama atenção o aumento de sobrevida medida no estudo, demonstrando uma alta eficácia da associação de novas drogas anticorpos monoclonais anti-PD1 e anti-PD-L1. A sinergia apresentada da combinação da QT com estas drogas anticorpos monoclonais, vem pesar na decisão compartilhada entre médico e pacientes, em relação ao tratamento, para enfrentar a “fera”.
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