Importância da quimioterapia de indução
Fleck, J.F.: Conexão Anticâncer 06(02), 2017
Em 2012 mais de 80 mil casos de carcinoma do nasofaringe foram diagnosticados no mundo, ocorrendo, predominantemente, no sudeste asiático, Micronésia, Polinésia e África setentrional. O caráter mais esporádico desta doença no ocidente cria uma importante limitação em estudos aleatórios, pois torna-se difícil reunir o número de pacientes necessários para a obtenção de poder estatístico. Esta é uma iniciativa que precisa partir de pesquisadores asiáticos, metodologicamente habilitados a desenvolver estudos cooperativos.
Um esforço cooperativo conduzido por vários hospitais universitários chineses reuniu, em pouco mais do que dois anos, 480 pacientes com carcinoma avançado de nasofaringe (estágios III a IVB) em um estudo prospectivo e aleatório, visando melhorar seu índice de curabilidade. O resultado foi positivo, sendo publicado na revista Lancet Oncology em 2016. A conclusão mais importante foi que a associação de três cursos de quimioterapia de indução (QT-I), prévios ao tratamento combinado e habitualmente usado de quimio-radioterapia (QRT), aumentava a sobrevida-livre de progressão (SVLP), a sobrevida global (SV) e a sobrevida livre de doença metastática (SVLM). A proporção de pacientes vivos em três anos de acompanhamento passou de 86% no braço de tratamento com QRT para 92% no braço que associava QT-I com QRT. Não houve diferença no controle local da doença, manifesta pela sobrevida livre de recidiva local (SVLRL) muito semelhante entre os dois braços do estudo. A QT-I parece ter agregado controle sistêmico.
O uso da QT-I no tratamento curativo do carcinoma do nasofaringe é uma questão polêmica na literatura internacional, com resultados conflitantes. Porém, esta dificuldade está centrada no menor número de pacientes reunidos em estudos anteriores e na dificuldade de identificação de um programa eficiente de quimioterapia com toxicidade aceitável, especialmente na população asiática onde a doença é mais prevalente. No estudo chinês foram associadas três drogas na QT-I (docetaxel, cisplatina e fluorouracil), cujas doses foram reduzidas em comparação aquelas usadas na população ocidental, garantindo um adequado índice terapêutico na população oriental. Esta adaptação parece ter sido essencial para que o estudo fosse positivo, pois apesar de a QT-I agregar toxicidade, esta foi mantida em um perfil aceitável para a população asiática. Embora os resultados sejam preliminares, a QT-I parece ter um efeito importante na redução da doença micrometastática, possivelmente aumentando o índice de curabilidade do carcinoma de nasofaringe.
O estudo chinês aponta para algumas limitações como a não quantificação da carga plasmática de DNA Epstein-Barr Vírus, a exclusão de pacientes com mais de 60 anos e a não uniformidade das doses de radioterapia. No entanto, nenhuma destas limitações compromete os resultados obtidos ou obscurece a louvável atitude das universidades chinesas em cooperar com sua experiência local na luta planetária contra o câncer.
Referência:
Ying Sun, Wen-Fei Li, Nian-Yong Chen, et al.: Induction chemotherapy plus concurrent chemoradiotherapy versus concurrent chemoradiotherapy alone in locoregional advanced nasopharyngeal carcinoma: a phase 3, multicentre randomised controlled trial, Lancet Oncology 17: 1509 – 20, 2016
Na oncologia, novos estudos que tragam benefícios e qualidade de vida aos pacientes é de grande importância.
Esse artigo evidencia a importância indireta da medicina baseada em evidência científica no resultado individual do paciente - seja ele oncológico, ou não. Ensaios clínicos bem desenhados, e com um "n" suficiente para gerar poder estatístico são essenciais para a futura tomada de decisão coerente do médico visando o melhor para o seu paciente - assim como esse estudo chinês que foi produzido com muito esforço pela comunidade científica desse país e que certamente gerou benefícios para aqueles com carcinoma de nasofaringe em todo o mundo.
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