Tratamento adjuvante do câncer de pâncreas

Vitória com o uso anacrônico de armas brancas

Fleck, JF & Cardoso, PN: Conexão Anticâncer 08(01), 2019

Entre os tumores malignos epiteliais, o carcinoma do pâncreas apresenta o maior índice de letalidade. A maior parte dos casos são diagnosticados como doença localmente avançada e/ou metastática, o que conduz a um índice de curabilidade geral inferior a 10%. No cenário paliativo, o uso de tratamento sistêmico com FOLFIRINOX (oxaliplatina + irinotecan + leucovorin + fluorouracil) conduziu a um aumento da sobrevida mediana (11.1 meses) ao ser comparada com aquela obtida com uso exclusivo de gemcitabina (6.8 meses).

O significativo ganho prognóstico obtido no cenário paliativo, tem sido investigado no cenário adjuvante em ressecções R0 (ausência de doença residual microscópica), sendo este conceito inadequadamente estendido para as ressecções R1 (presença de doença residual microscópica). Historicamente, três estudos aleatórios e prospectivos internacionais vem proporcionando ganhos progressivos em sobrevida livre de progressão (SLP) e sobrevida global (SG). A tabela abaixo ilustra os aspectos mais relevantes da demografia e desfechos.

O estudo GONKO publicado na revista JAMA em 2013, incluiu pacientes com carcinoma de pâncreas, predominantemente com ressecção R0 e sustentou a evidência de benefício com gemcitabina em tratamento sistêmico adjuvante. Em 2017, o estudo ESPAC 4 foi publicado na revista Lancet, mostrando benefício prognóstico com o uso de quimioterapia adjuvante combinada incluindo gemcitabina + capecitabina, particularmente em pacientes com ressecção completa (R0), atingindo a inédita sobrevida global mediana de 39.5 meses. Mais recentemente, em dezembro de 2018, foi publicado no New England Journal of Medicine o estudo PRODIGE 24 que adicionalmente melhorou as medianas da SLP (21.6 meses) e a SG (54.4 meses) com o uso adjuvante de FOLFIRINOX modificado (diminuição da dose de irinotecan e retirada do uso em bolus de fluorouracil). Este ganho ocorreu às custas de expressiva, mas tolerável toxicidade. Apesar de incluir um percentual maior de pacientes R1, a SG mediana foi expressivamente maior do que a observada em controles históricos e justificada pelo crossover no braço controle, permitindo o uso de FOLFIRINOX após progressão à gemcitabina. O estudo PRODIGE 24 representa o novo standard para tratamento adjuvante do carcinoma de pâncreas em pacientes com bom-performance e mostra que mesmo na era dos tratamentos inteligentes e customizados ainda existe um espaço de ganho com armas brancas (quimioterapia).

 

                                          


Referências:

Helmut Oettle, Peter Neuhaus, Andreas Hochhaus, et al: Adjuvant Chemotherapy with Gemcitabine and Long-term Outcomes Among Patients with Resected Pancreatic Cancer the CONKO-001 Randomized Trial, JAMA 310(14): 1473 – 1481, 2013

John P Neoptolemos, Daniel H Palmer, Paula Ghaneh, et al:Comparison of adjuvant gemcitabine and capecitabine with gemcitabine monotherapy in patients with resected pancreatic cancer (ESPAC-4): a multicentre, open-label, randomised, phase 3 trial, Lancet389: 1011-1024, 2017

T. Conroy, P. Hammel, M. Hebbar, M. Ben Abdelghani, et al: FOLFIRINOX or Gemcitabine as Adjuvant Therapy for Pancreatic Cancer, N Engl J Med379: 2395 – 2406, 2018