Redução para três meses de quimioterapia no tratamento adjuvante do carcinoma de cólon estádio III – The IDEA pool analysis

Visão ética multidimensional no lançamento de uma moeda com duas faces

Fleck, JF & Gössling, G: Conexão Anticâncer 23(04), 2018

O carcinoma de cólon corresponde a uma das neoplasias malignas mais prevalentes no mundo. No estádio III, o tratamento com intensão curativa é essencialmente cirúrgico, seguido de quimioterapia adjuvante. O benefício da adjuvância é probabilístico, pois baseia-se na suposta permanência de doença micrometastática após adequada ressecção Ro. Todavia, a presença de micrometástases não é uma regra e muitos pacientes poderiam já estar curados com cirurgia exclusiva. Mesmo com a identificação de grupos prognósticos com maior probabilidade de benefício (menor NNT), muitos pacientes são, ainda, tratados desnecessariamente. Adicionalmente, os programas de quimioterapia adjuvante considerados standard (FOLFOX e CAPOX) não são destituídos de toxicidade e estão longe de um NNH ideal. Ambos podem conduzir ao óbito em pacientes mau metabolizadores de fluoropirimidinas e estão associados a morbidades temporariamente limitantes como a neuropatia sensorial periférica e a eritrodisestesia palmo-plantar (síndrome mão-pé). Outra forma de toxicidade até certo ponto assintomática, porém preocupante, é a hiperplasia sinusoidal hepática, que está comprovadamente associada a doses acumulativas crescentes de oxaliplatina. Tratar probabilidades na ausência de marcadores preditivos de resposta ou risco requer o uso de critérios cada vez mais precisos e o mínimo tempo de exposição considerado eficiente.

A despeito da toxicidade, a adjuvância com fluoropirimidinas no cancer de cólon estádio III reduziu em aproximadamente 30% o risco relativo de recidiva ou óbito, o que conduziu a um ganho absoluto de sobrevida livre de progressão em 5 anos de aproximadamente 10%. Este ganho foi magnificado ao substituir o uso modulado de fluoropirimidinas pela administração de adjuvância por 6 meses com FOLFOX ou CAPOX, produzindo uma redução adicional de 20% no risco relativo de óbito e levando a um incremento adicional de 5% na sobrevida global. A introdução da oxaliplatina melhorou umas face da moeda (NNT), porém agregou toxicidade. Para trabalhar na outra face da moeda (NNH) tornou-se necessário explorar a não-inferioridade com a redução do tempo de adjuvância para apenas três meses (esquema curto) versus 6 meses (esquema longo).

Criado em 2006, o grupo IDEA (International Duration Evaluation of Adjuvant Therapy) reuniu médicos e estatísticos de 12 países, envolvidos em seis estudos prospectivos e aleatórios que buscaram reduzir três meses (50%) no tempo de tratamento adjuvante do carcinoma de cólon estádio III. Uma pool analysis foi publicada no New England Journal of Medicine em março de 2018. Foram analisados 3263 eventos de recidiva ou morte em uma população constituída por 12834 pacientes com carcinoma de cólon, estádio III submetidos a quimioterapia adjuvante com FOLFOX ou CAPOX. Infelizmente, a não-inferioridade do esquema curto não foi evidenciada na totalidade dos pacientes analisados (HR = 1.07), mas foi confirmada em pacientes tratados com CAPOX (HR = 0.95). Adicionalmente, em análise exploratória, o benefício da não-inferioridade do esquema curto evidenciou-se particularmente no subgrupo de pacientes com estádio III de baixo risco (T1-3 N1), não podendo ser estendida para pacientes com estádio III de pior prognóstico (T4 ou N2).

O cenário probabilístico ideal no lançamento de uma moeda com duas faces pode remeter a uma meta inatingível, porém a ciência médica busca a melhor aproximação, otimizando a relação NNT/NNH.

 

 NNT = Número de pacientes que é necessário tratar para que um paciente apresente desfecho favorável; NNH = Número de pacientes que é necessário tratar para que um paciente apresente efeito adverso

 

 Referência:

A. Grothey, A.F. Sobrero, A.F. Shields, et al: Duration of Adjuvant Chemotherapy for Stage III Colon Cancer, New Engl J Med 378: 1177 – 88, 2018