Movimento translacional reprimido por 30 anos
Peixoto, J & Fleck, JF: Conexão Anticâncer 30(10), 2018
O carcinoma brônquico de pequenas células (CBPC) corresponde a 15% da expressão morfológica do câncer de pulmão, sendo predominantemente (70%) diagnosticado como doença extensa (DE). O tratamento é sistêmico e centrado no dublet de quimioterapia (QT) composto por platina + etoposide. Trata-se de um tumor muito proliferativo que apresenta alto índice de resposta inicial à QT, porém com duração efêmera, o que conduz a uma sobrevida mediana de apenas 10 meses. Este comportamento intrigante é justificado pela elevada taxa de mutações. Há emergência precoce de resistência celular combinada à impossibilidade de reconhecimento das células tumorais pelo sistema imunológico. Em 2018, o Prêmio Nobel de Medicina foi conferido aos pesquisadores James Allison da Universidade do Texas e Tasuku Honjo da Universidade de Kyoto pela identificação das proteínas CTLA-4 e PD-1 que paralisam o sistema imunológico. Este conceito vem sendo utilizado com sucesso no tratamento de tumores imunogênicos como o carcinoma brônquico. A hipótese consiste em adicionar um anticorpo monoclonal contra PD-1 ou PD-L1, visando ativar o sistema de reconhecimento imunológicos das células tumorais.
Em setembro de 2018, o New England Journal of Medicine publica os resultados do estudo IMPower133 Study Group, também apresentado em Toronto por ocasião da 19th World Conference on Lung Cancer. O ensaio clínico avaliou a eficácia e segurança da adição de atezolizumab (bloqueio duplo PD-L1 + B7.1 restaurando a resposta imunológica anti-tumoral) versus placebo no tratamento de primeira linha do CBPC–DE com carboplatina + etoposide. Os pacientes foram aleatoriamente distribuídos para o grupo atezolizumab (n=201), ao grupo placebo (n=202). Em um seguimento mediano de 13,9 meses, a mediana a sobrevida global foi de 12,3 meses no grupo atezolizumab e de 10,3 meses no grupo placebo (HR 0,70; IC 95% 0,54 - 0,91; P = 0,007). A mediana da sobrevida livre de progressão foi de 5,2 meses e 4,3 meses, respectivamente para os grupos atezolizumab e placebo (HR 0,77; IC 95% 0,62 - 0,96; P = 0,02). O perfil de segurança do atezolizumab + carboplatina e etoposide foi consistente com o previamente relatado dos agentes individuais, sem novos achados relevantes. Embora o ganho em sobrevida tenha sido de apenas 2 meses, o estudo IMPower133 foi recebido com muito entusiasmo pela comunidade científica internacional, pois há 30 anos a sobrevida mediana do CBPC-DE encontrava-se paralisada nos 10 meses. O estudo IMPower133 soma-se a tendência internacional crescente de deslocar o foco terapêutico da QT citotóxica para a sofisticação dos check points imunológicos na busca pela cronificação do câncer avançado.
Referência:
L. Horn, A.S. Mansfield, A. Szczęsna, et al: First-Line Atezolizumab plus Chemotherapy in Extensive-Stage Small-Cell Lung Cancer, N Engl J MedSep 25th, 2018
Muito interessantes os achados, em um estudo muito bem conduzido e descrito. De fato, é uma grande satisfação verificar a translação do conhecimento de bancada para a prática clínica, mesmo que tardiamente. Uma dúvida que me surgiu ao verificar a separação tardia (por volta do 9º ou 10º mês) entre as curvas de sobrevida global entre os grupos intervenção e controle é: será que a utilização da imunoterapia de forma exclusivamente sequencial ou de manutenção ao tratamento já preconizado (platina + etoposide), em vez de forma concorrente como foi feito no estudo, traria benefícios semelhantes ao do estudo? Que este estudo nos instigue cada vez mais a procurar tratamentos inovadores que tragam benefícios aos pacientes, mesmo em cenários que antes parecessem estáticos, como o do carcinoma brônquico de pequenas células.
Artigo muito interessante, parabéns!
Acredito que seja muito importante esse artigo, e desejo que cada vez mais se alcance melhores resultados, não só no câncer de pulmão de pequenas células, mas para muitos outros cânceres, não posso negar que fiquei um pouco frustrado com a sobrevida média pós uso de atezolizumab mais quimioterapia, porém esse resultado deve ter efeito significativo na vida dos pacientes que é o que mais importa. Desejo também que com o uso maior dos medicamentos biológicos, este se torne cada vez mais acessível uma vez que seu uso em todas as áreas da medicina causa um impacto muito grande na saúde financeira dos sistemas de saúde. O avanço da ciência deve andar alinhada com praticabilidade.
Por ano, cerca de 1,8 milhões de casos novos de carcinoma de pulmão são diagnosticados no mundo, segundo a IARC/OMS. Mas, apesar da evolução dos esquemas de quimio e radioterapia nas últimas décadas, certos subtipos de cânceres não apresentaram incremento de sobrevida para os pacientes, como é o caso do de pequenas células. A introdução da imunoterapia tornou-se na última década passo fundamental para o avanço terapêutico de potencialmente toda Oncologia, avanço este já consolidado para tratamento curativo de carcinoma brônquico não de pequenas células com durvalumab (Antonia et al, 2017), por exemplo. Seguindo a mesma lógica, o avanço obtido, embora pequeno (incremento de 2 meses de sobrevida global), no estudo IMPower133 para carcinoma de pequenas células é somente o começo e deve ser encarado como um tratamento vanguardista que será com certeza potencializado com o aprofundamento das pesquisas na área.
Como "vencer" um vencedor? O câncer vence o sistema imune, a supressão de fatores de crescimento, a morte celular e etc, por fim o portador da doença. O carcinoma brônquico age dessa forma, vence o sistema imune, e mesmo após anos tentando combatê-lo, progresso limitado tem sido feito na terapia de primeira linha para doença extensa. Há pesquisa em oncologia está sempre em evolução, e o tema da vez é a imunoterapia. Para avaliar a eficácia e segurança da combinação de um inibidor de checkpoint + quimioterapia, foi realizado o estudo IMpower133. A sobrevida global foi prolongada com atezolizumabe versus placebo (mediana, 12,3 vs. 10,3 meses; HR, 0,7; P = 0,007), com benefício de sobrevivência em todos os subgrupos. Apesar de a sobrevida não ser muito extensa, 2 meses, é notável ao lembrarmos que são os primeiros resultados positivos de um estudo fase III, e de um associando imuno + quimioterapia, além de que é uma doença extremamente difícil de se tratar. Um pequeno passo para o tratamento do carcinoma brônquico, um grande salto para o tratamento em oncologia.
Muito bom artigo! Sem dúvidas, os achados do estudo representam uma nova realidade em relação ao conhecimento do câncer de modo geral, da sua fisiopatologia e dos potenciais alvos terapêuticos. A imunoterapia com o Atezolizumab, no caso do carcinoma brônquico de pequenas células, aumentou tanto a sobrevida livre de progressão quanto a sobrevida global do grupo intervenção em relação ao grupo placebo. O conhecimento dos check points imunológicos permitiu a execução, na prática, do que outrora parecera impossível: a remissão completa de processos neoplasicos - inclusive metastáticos - a partir de uma intervenção farmacológica simples, mas sofisticada. Assim como as proteínas PD-1 e CTLA-4, outras tantas já foram identificadas e estão sendo estudadas. Os poucos meses de sobrevida acrescidos aos pacientes do trial pelo Atezolizumab podem representar apenas o início de uma nova era na abordagem terapêutica do paciente oncológico.
O artigo apresenta achados promissores relacionados à uma doença agressiva e pouco responsiva aos tratamentos. Apesar de ser pequeno o aumento na sobrevida e na sobrevida livre de progressão, é de extrema importância essa conquista pois, antes dela, o prognóstico e o panorama geral da doença estava estagnado há 30 anos. É importante o reconhecimento da comunidade acadêmica internacional à esses achados porque isso aumenta a visibilidade da doença, atrai interesse público e incentiva pessoas a se aprofundarem no conhecimento dos checkpoints imunológicos e suas possíveis aplicações na prática médica como um todo, não só na área oncológica. É interessante mencionar que tecnologia que usa bacteriófagos para alterações genéticas possibilitadoras da produção de anticorpos monoclonais, como os da intervenção do artigo, também foi reconhecida com o Prêmio Nobel de Química de 2018.
Muito bom! O estudo encontrou dados significantes e bastante relevantes para o tratamento do CBPC. A sobrevida dos pacientes que utilizaram o novo tratamento aumentou em 2 meses, pode parecer pouco, mas ao ver que o tempo de sobrevida estava estagnado em 10 meses, fico entusiasmado com os possíveis avanços que poderão ser feitos a partir da realização de novos estudos. O que faríamos se pudéssemos prolongar o tempo de vida das pessoas que amamos? Como não se sentiram os familiares e o portador do CBPC ao saber que teria 2 meses a mais ao lado de quem se ama? São questões interessantes a se pensar também. Lidar com a perda, a morte e o consequente luto é algo bem difícil e profundo para a maioria das pessoas e a noa descoberta que este estudo trás leva a avanços não só no campo científico mas também no emocional.
Interessante como o progresso da ciência vai permitindo identificar novos alvos para o tratamento dos diferentes tipos de câncer e mudando cenários antes estáticos. Mesmo que uma sobrevida de 2 meses pareça pequena, ela já dá esperança de que novos medicamentos possam agregar, cada vez mais, esperança de melhor prognóstico em cânceres de difícil tratamento, como o CBPC. E, nesses casos, fica claro como a pesquisa básica tem grandes reflexos no manejo clínico. Dois pesquisadores que identificaram uma proteína chave na resposta imune ganharam prêmio Nobel - quando muitos pensam que a pesquisa básica, como identificar uma de tantas proteínas envolvidas na resposta imune e na carcinogênese, não tem tanta importância. O achado desses dois pesquisadores hoje se reflete em 2 meses a mais de sobrevida em uma doença que há muito tempo estava com 10 meses de sobrevivência média pós-tratamento. E, se os efeitos adversos relacionados com o sistema imune são maiores no grupo tratado com atezolizumab, saber quais são esses efeitos e poder monitorá-los pode dar ao paciente 2 meses a mais de vida com um pouco mais de qualidade.
Os resultados são, sem dúvidas, animadores - é entusiasmante ver a aplicação da pesquisa em ciência básica na prática clínica. A doença é extremamente agressiva e não tem resposta adequada à terapêutica. Ainda que a sobrevida não seja a desejada pelos pacientes e pela equipe médica, novas terapêuticas poderão ser desenvolvidas futuramente... Ademais, a doença estava com opções terapêuticas estagnadas há décadas - se trata de uma notícia estimulante no campo, já que, ainda que seja uma pequena conquista na terapêutica do carcinoma de pulmão, é uma grande conquista na terapêutica em Oncologia representada nos novos enfoques em intervenções para os pacientes futuramente.
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