Irradiação do tumor primário no tratamento do carcinoma de próstata metastático hormônio-sensível

Metanálise adaptativa

Fleck, JF & Souza, F: Conexão Anticâncer 23(04), 2019

O tratamento do câncer de próstata metastático hormônio-sensível (CPM-HS) é constituído primariamente por privação androgênica (agonistas ou antagonistas-LHRH), combinada com abiraterona ou docetaxel. Recentemente, modelos experimentais deram suporte a um racional para o uso associado de radioterapia dirigida ao tumor primário. Em outubro de 2018, a revista Lancet publicou os resultados do braço H de um estudo multicêntrico britânico denominado Stampede Trial. Um total de 2061 pacientes diagnosticados CPM-HS foram distribuídos aleatoriamente para tratamento sistêmico exclusivo (grupo controle) ou tratamento sistêmico + radioterapia dirigida ao tumor primário (RT-TP). Foram utilizados dois programas de radioterapia: Frações semanais de 6 Gy / 6 semanas, totalizando 36 Gy ou 20 frações diárias de 2.75 Gy / 4 semanas, totalizando 55 Gy. Contrário a hipótese alternativa, a RT-TP não alterou a sobrevida global (HR 0.92 p=0.266). Todavia, em análise exploratória, foi possível identificar que um subgrupo de pacientes (40% da amostra) com baixa carga metastática (< 4 metástases ósseas restritas ao esqueleto axilar e/ou comprometimento linfonodal), apresentava benefício em sobrevida global com o uso de RT-TP (HR 0.68 p = 0.007). O benefício incluía ambos os programas de RT-TP, cuja baixa toxicidade aguda e tardia, permitiu sugerir um novo standard de tratamento, restrito a este subgrupo específico.

Visando melhorar o nível de evidência, em fevereiro de 2019, a revista European Urology publica os resultados da revisão sistemática + metanálise conhecida pelo acrônimo STOPCAP. Uma nova estrutura de metanálise adaptativa foi utilizada, definindo prospectivamente seu método de revisão que incluiu acesso ao banco de dados dos estudos selecionados. Sempre que possível, foi buscada a uniformização de critérios, potencialmente, reduzindo o grau de heterogeneidade da metanálise. Adicionalmente, foram utilizados os critérios da Cochrane Collaboration Risk of Bias para a redução de vieses. Preliminarmente, a revisão avaliou 19830 casos, distribuídos em sete estudos clínicos. Todavia, quatro estudos foram excluídos e um não havia completado a inclusão de pacientes. Restaram apenas dois estudos (STAMPEDE e HORRAD), sendo que o primeiro participou com um número de pacientes quase quatro vezes maior, o que fragilizou a metanálise. Todavia, esta é uma interessante metodologia em evolução que obteve suporte do Medical Research Council and Prostate Cancer UK permitindo a progressiva coleta e incorporação de novos dados individuais, talvez gerando um novo modelo cooperativo de investigação clínica. Guardando as limitações temporárias do método, a atual publicação STOPCAP não identificou benefício com o acréscimo de RT-TP na sobrevida global (HR=0.92, p=0.195) ou sobrevida livre de progressão (HR=0.94, p=0.238) de pacientes CPM-HS tratados com privação androgênica. O benefício do acréscimo da RT-TP ao tratamento de privação androgênica restringiu-se aos desfechos substitutivos de falha bioquímica (HR=0.74) e sobrevida livre de falha (HR=0.76). Como este último desfecho incluía em seu conceito a progressão bioquímica, evidenciou-se uma esperada sobreposição de resultados. Como já antecipado na publicação anterior do Stampede Trial, a metanálise STOPCAP também identificou benefício na sobrevida global no subgrupo de pacientes CPM-HS com baixa carga metastática, ou seja, 4 ou menos sítios de disseminação óssea. Neste subgrupo houve um incremento absoluto de 7% na sobrevida em três anos. A progressiva inclusão dos novos dados de estudos clínicos em fase de maturação irá tornar mais robusta a estrutura da metanálise adaptativa e consolidar a metodologia.  

 

Referências:

Higgins JP, Altman DG, Gotzsche PC, et al. The Cochrane Collaboration's tool for assessing risk of bias in randomised trials. BMJ343:5928, 2011

Christopher C Parker, Nicholas D James, Christopher D Brawley, et al: Radiotherapy to the primary tumour for newly diagnosed, metastatic prostate cancer (STAMPEDE): a randomized controlled phase 3 trial, Lancet, Oct 21st, 2018

Sarah Burdett, Liselotte M. Boeve, Fiona C. Ingleby, et al: Prostate Radiotherapy for Metastatic Hormone-sensitive Prostate Cancer: A STOPCAP Systematic Review and Meta-analysis, Eur Urol, Feb 5, 2019