Carcinoma de endométrio de alto risco

Identificando o risco e maximizando o tratamento

Gössling, G & Fleck, JF: Conexão Anticâncer 26(03), 2018

Dados epidemiológicos da International Agency for Research on Cancer (IARC) revelam uma incidência de aproximadamente 5% para o câncer de endométrio, contribuindo para somente 2% da mortalidade geral por tumores sólidos malignos no sexo feminino. A baixa taxa de mortalidade é explicada pelo diagnóstico precoce, com predomínio de fatores prognósticos favoráveis. Não obstante, 15% dos casos são diagnosticados como alto risco e caracterizados pela histologia endometrioide grau 3, com invasão linfo-vascular, estágio II e III, bem como expressão morfológica não-endometrioide (seroso ou células claras). Os casos classificados como alto risco tem maior chance de recidiva local e sistêmica, criando uma janela terapêutica para o tratamento adjuvante. Um estudo de fase II (RTOG 9708) mostrou que a associação de quimio-radioterapia (QRT) seguida de quimioterapia adjuvante proporcionava, aos quatro anos de acompanhamento, uma sobrevida global de 85% e uma sobrevida livre de progressão de 81% em pacientes diagnosticadas com carcinoma de endométrio de alto risco.

Em fevereiro de 2018, a revista Lancet Oncology publica os resultados do estudo multicêntrico PORTEC-3 visando interferir tanto no controle local como sistêmico do carcinoma de endométrio de alto risco. Consistiu em um estudo prospectivo aleatório de fase III, comparando radioterapia (RT) pós-operatória exclusiva com QRT (constituída por RT combinada com duas doses de cisplatina radio-sensibilizante seguida de 4 ciclos de quimioterapia adjuvante composta por Carboplatina AUC 5 + paclitaxel 175 mg/m2, administrados a cada 21 dias). O braço QRT produziu uma maior sobrevida livre de progressão (HR 0.71 p = 0.022). A sobrevida global não diferiu significativamente, após 5 anos de acompanhamento ( HR 0.76 p = 0.11) e ocorreu expressivo aumento de toxicidade grau 3 no braço QRT (60%) versus RT (12%). O maior benefício em da QRT ocorreu na sobrevida livre de progressão de pacientes estádio III (HR 0.66 p= 0.014). Em análise multivariada, a idade (≥ 70 anos) foi um fator preditivo de resposta favorável à QRT. A falha de benefício em sobrevida global e a elevada toxicidade grau 3, não sustentam a QRT como standard de tratamento para o carcinoma de endométrio de alto risco. Todavia, o ganho em sobrevida livre de progressão, especialmente em mulheres idosas e com estádio III conduzem a sua consideração em decisão compartilhada. Cada vez mais, o paciente vira protagonista em um cenário de decisões que extrapolam os dados estatísticos. A medicina deixa de ser puramente probabilística e fica fortalecida no caráter específico, humano e ético das decisões customizadas.

 

Referência:

Stephanie M de Boer, Melanie E Powell, Linda Mileshkin, et al: Adjuvant chemoradiotherapy versus radiotherapy alone for women with high-risk endometrial cancer (PORTEC-3): final results of an international, open-label, multicentre, randomised, phase 3 trial, Lancet Oncol 19: 295–309, 2018