Uso diário de aspirina pode reduzir o risco de câncer de ovário
Fleck, J.F.: Conexão Anticâncer, 4(12):2014
O câncer de ovário é um tumor de alta letalidade e difícil de ser diagnosticado. Epidemiologistas estimam que 22.240 mulheres americanas sejam diagnosticadas com câncer de ovário em 2014. Destas mulheres, 14.030 morrerão da doença. Entretanto, uma recente pesquisa publicada pelo Journal of the National Cancer Institute (JNCI), divulgou que o uso diário de aspirina pode diminuir em até 20% o risco de câncer de ovário.
Foram analisados 12 estudos epidemiológicos para avaliar o papel protetor da aspirina, anti-inflamatórios não-esteroides (AINE) ou acetaminofen em 8000 mulheres com câncer de ovário e 12000 mulheres que não apresentavam a doença. O revisão mostrou uma redução de 20% na incidência de câncer de ovário em mulheres que faziam uso diário de aspirina. No grupo que usava AINE a redução da incidência foi menor (10%), não atingindo níveis de significância e não houve benefício detectado com o uso de acetaminofen.
Observou-se, ainda, que o uso diário de aspirina pode reduzir a incidência de câncer de cólon, um tumor muito prevalente no mundo. Entretanto, o uso de aspirina diariamente pode causar outras reações adversas, por isso, o estudo deve passar por ensaios clínicos adicionais prospectivos com maior nível de evidência, buscando determinar o índice terapêutico ( riscos versus benefícios ).
Embora a revisão seja promissora na identificação da aspirina como uma droga útil na farmacoprevenção do câncer de ovário, as evidências ainda não sustentam sua recomendação rotineira.
Referência:
B Trabert, et al. Aspirin, non-aspirin NSAID, and acetaminophen use and risk of invasive epithelial ovarian cancer: a pooled analysis in the Ovarian Cancer Association Consortium. JNCI. February 6, 2014. DOI: 10.1093/jnci/djt431.
A utilização de medicamentos de forma indiscriminada é extremamente perigosa para os pacientes, que nem sempre conhecem as reações adversas e toxicidade dos mesmos. Qualquer utilização de medicamentos deve ser feita com acompanhamento médico, avaliando-se os riscos e benefícios. A divulgação de pesquisas pela mídia muitas vezes causa confusão para os leigos gerando um uso abusivo de medicamentos e provocando sérios problemas de saúde.
Há muito tempo que a aspirina tem sido heroína e vilã na história da medicina. Sempre surgem pesquisas controversas. Essa permanente discussão nos encoraja a obter uma compreensão mais clara e fundamental sobre os riscos e benefícios dessa droga que não deve ser utilizada de forma indiscriminada.
Os pacientes muitas vezes se sentem entusiasmados pela mídia e acabam fazendo uso de medicações sem orientação médica. Julgar riscoXbenefício cabe aos nossos médicos!
A ingestão de medicamento sem a prescrição médica, mesmo que já existam estudos a favor é um hábito perigoso que pode causar grandes danos à saúde. De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o uso indevido de medicamentos é considerado hoje um problema de saúde pública, não só no Brasil, mas mundialmente.
A aspirina é uma medicaçaõ de uso amplo pela população com evidência sólida na prevenção secundária de eventos cardiovasculares secundários, no sentido em que diversos estudos, como Li et al, 2017, demonstraram benefício em relação ao seu maior efeito colateral: sangramento gastrointestinal. Ainda em 2018, questiona-se o real benefício do AAS na prevenção primária para eventos cardiovasculares, como apresentado pelo estudo ARRIVE recentemente. Apesar de o artigo ao qual meu comentário se refere ser de 2014, a discussão sobre a influência do AAS na redução do câncer de ovário ainda é atual(Wield et al, 2018), uma vez que estudos observacionais demonstraram aparente benefício, porém os mecanismos e as recomendações de realizar a prescriçaõ adequandamente não são bem estabelecidos.
Uma alternativa fácil na prevenção de um câncer com alta mortalidade parece uma descoberta promissora. Quando analismos os baixos riscos associados ao uso contínuo de aspirina e comparamos com os benefícios de uma possível redução de 20% do risco de câncer de ovário, imediatamente nos ocorre o ímpeto de receitar a aspirina. Porém, frente a um mundo científico, essencialmente moldado em evidências, não devemos modificar nossa conduta baseada única e exclusivamente num único fragmento de conhecimento. Há de se juntar várias peças para assim teremos um visão mais completa do quebra-cabeça.
Todo e qualquer medicamento deve ser prescrito por um médico, que com seu conhecimento fará o balanço adequado entre os prós, contras e a necessidade para tal. É empolgante que estudos com medicamentos simples, como a aspirina, possam trazer novidades acalentadoras como a diminuição do risco de câncer, porém é necessário conter a empolgação e analisa-los de forma objetiva como os vieses, o tipo de estudo, visando não sermos influenciados pela simplicidade de um medicamento com grandes ambições mas sim pela qualidade do estudo que produziu tal resultado.
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