Explicação fractal especulativa
James Fleck, MD, PhD: Conexão Anticâncer 11 (09), 2021
O padrão fractal está presente em toda a natureza. Esses dois leopardos podem não ser exatamente iguais, mas a autossimilaridade leva à identificação imediata da espécie. Na verdade, o padrão da pele de leopardo é fractal, uma forma geométrica irregular e fragmentada que pode ser dividida em partes, cada uma das quais é uma cópia em tamanho reduzido do todo, conforme definido por Benoît Mandelbrot. Em 1980, o matemático integrou a IBM, onde usou números complexos e polinômios quadráticos para construir uma imagem de iteração infinita. Essa imagem, conhecida como conjunto de Mandelbrot, foi a primeira a reproduzir em sistema eletrônico a geometria fractal encontrada na natureza. A geometria fractal é definida por vários níveis de organização, formas irregulares e autossimilaridade. Transposta para modelos biológicos, essa expressão fenotípica está presente tanto na saúde quanto na doença. As células tumorais possuem expressão fractal, o que permite a identificação de padrões específicos utilizados no diagnóstico patológico. Vamos tomar o adenocarcinoma de pulmão como um modelo experimental. A heterogeneidade do tumor já foi identificada à microscopia ótica em cinco subtipos histológicos anteriormente descritos (lepídico, acinar, papilar, micropapilar e sólido). Cada subtipo é uma imagem de iteração que possibilita um diagnóstico morfológico específico.
Desde o início do século XXI, uma expressão molecular incipiente vem sendo descrita na maioria dos tumores sólidos. Em 2014, o Lung Cancer Mutation Consortium reuniu 20 instituições nos Estados Unidos e identificou mutações driver em 62% dos adenocarcinoma de pulmão. Os pacientes que expressaram mutação driver e foram tratados com drogas direcionadas a alvos biológicos tiveram uma sobrevida mediana de 3,5 anos. Os pacientes que expressaram mutação driver e que não receberam terapia biológica direcionada tiveram uma sobrevida mediana de 2,4 anos. A sobrevida mediana diminuiu ainda mais (2,1 anos) nos pacientes que não expressaram mutação driver e não foram tratados com terapia direcionada por alvo biológico. Consequentemente, a identificação de uma mutação driver passou a ser um parâmetro de qualidade na assistência aos pacientes com câncer de pulmão. Atualmente, várias mutações driver são descritas no adenocarcinoma de pulmão, criando padrões genômicos, cuja geometria espacial molecular ainda não foi totalmente identificada. A figura representa nove mutações driver encontradas no adenocarcinoma de pulmão, mostrando sua respectiva porcentagem de expressão.
Cada fenótipo molecular descrito no adenocarcinoma do pulmão é uma mutação acionável e tem sido usado para desligar o comportamento aditivo das células oncogênicas. A tabela a seguir descreve algumas opções terapêuticas para o adenocarcinoma pulmonar avançado conforme o fenótipo molecular. O grau de recomendação varia de acordo com as evidências já fornecidas no ensaios clínicos.
Infelizmente, este é um processo dinâmico e a plasticidade fenotípica molecular oportunista do adenocarcinoma de pulmão facilmente conduz à expressão de resistência aos medicamentos. O reconhecimento de uma suposta geometria molecular espacial e seu comportamento multidimensional será um passo importante para melhorar os resultados terapêuticos no adenocarcinoma de pulmão.
Referências:
1. Benoît Mandelbrot: The Fractal Geometry of Nature, 1983
2. Lung Cancer Mutation Consortium, 2014: https://www.lungcancerresearchfoundation.org/research/lung-cancer-mutation-consortium/
3. Ian Stewart: Mathematics of Life: Unlocking the Secrets of Existence, Profile Books, 368p, London, 2012
Os avanços na descoberta de mutações é muito interessante. Saber que determinados pacientes podem ganhar maior perspectiva de vida, ganhando anos em seus tratamentos, é de grande importância ainda mais dentro da Oncologia, onde todos os tipos de intervenções fazem diferença não só para a medicina, quanto para o paciente que ganha com sobrevida. É realmente incrível e motivador ter esse passo como uma alternativa para os tratamentos.
A medicina personalizada é uma das grandes apostas para o futuro do tratamento oncológico. Observar este quadro sob o prisma proposto por Mandelbrot é uma forma interessante de analisar o problema: se a natureza tende a seguir padrões, que uma vez identificados são razoavelmente previsíveis, isso pode e deve ser usado como ferramenta para tornar o tratamento do câncer mais específico e direcionado, e por consequência mais efetivo e seguro.
Achei interessante a analogia entre diferentes áreas do conhecimento, incluindo a matemática. O conjunto de Mandelbrot, os fractais biológicos e as assinaturas moleculares de câncer de pulmão podem ser colocados em diferentes grupos para uma análise profunda de cada heterogeneidade. Descobrir e classificar autossimilaridades em adenomas de pulmão é uma forma criativa de personalizar e aumentar a expectativa de vida em cada paciente, pois desse modo é possível se usar fármacos específicos para cada assinatura genética de câncer de pulmão. Acredito que este seja o caminho para uma melhor compreensão de doenças tão desafiadoras do ponto de vista curativo.
A personalização da medicina é a chave para o tratamento de diversas condições, em especial as doenças oncológicas. Foi interessante observar sob a ótica da analogia proposta, analisando os padrões seguidos pela natureza, com o objetivo de exemplificar o futuro do tratamento de doenças neoplásicas: personalizado, seguro e eficaz.
O tratamento oncológico cada vez mais tem sido visto sob o prisma da personalização, tanto a terapia individualizada para cada pessoa quanto a intervenção confeccionada para um tipo de câncer específico. No caso do câncer de pulmão, isso tem se tornado ainda mais expressivo, segundo o que mostram as pesquisas. Embora exista um nítido obstáculo a se transpor, que é a resistência aos fármacos direcionados por alvo biológico, é possível perceber que grandes avanços podem ser alcançados caso seja direcionada uma maior atenção científica a esses tratamentos.
O tratamento personalizado que a medicina oncológica proporciona é de extrema importância para melhorar a expectativa de vida dos pacientes com câncer de pulão. A perspectiva dos fractais biológicos e as assinaturas moleculares de câncer de pulmão propõe uma análise mais robusta quanto á heterogeneidade dos cânceres de pulmão e também dos tratamentos mais adequados para cada tipo de mutação. A análise de expressão desses tipos de cânceres de pulmão através das tecnologias possibilitam o melhor tratamento para esses pacientes.
É interessante ver como teorias matemáticas já conhecidas podem ser conectadas de maneiras novas à realidade para produzir conhecimento de forma inovadora. A relação entre câncer e fractais nos permite inferir muito sobre as propriedades dos padrões formados, e o fato de cada mutação gerar uma geometria fractal individualizada tem aplicações tanto no estudo do processo de crescimento e do tratamento de cada tumor quanto no diagnóstico de precisão. O uso de algoritmos para decomposição do conjunto de padrões presentes pode ser a chave para aplicar inteligência artificial ao diagnóstico molecular e melhorar muito sua acurácia e o tratamento específico.
É interessante notar como a geometria fractal pode ser utilizada para compreender melhor a heterogeneidade desse tipo de tumor e como a identificação de mutações driver tem se tornado um parâmetro importante na assistência aos pacientes com câncer de pulmão. No entanto, é importante ressaltar que a plasticidade fenotípica molecular desse tipo de tumor pode levar à expressão de resistência aos medicamentos, o que torna o processo de tratamento dinâmico e desafiador.
Faça o login para escrever seu comentário.
Se ainda não possui cadastro no Portal Conexão Anticâncer, registre-se agora.